Adeus, mister!

João Mousinho

Uma amizade não está balizada sobre questão temporal, mas através das relações de respeito, lealdade, carinho e admiração. Ele tinha 58 anos de idade, muito bem vividos, ao lado de familiares e amigos construiu uma rede de pessoas que queriam somente gozar de sua companhia. Miguel Gonçalves era um daqueles sujeitos do bem, sim, na prática, no cotidiano. Uma daquelas pessoas que nos fazem crer que essa existência e os seres humanos ainda merecem uma chance num planeta tão degradado pelas suas relações.

Uma dor no peito, na madrugada desta terça-feira, 21/8, foi implacável com mister Miguel. Ele nos deixou sem avisar, sem cerimônia…Como foi fugaz, como se não quisesse dar satisfação aos dogmas sociais. Ele se foi. Não dar para acreditar. Com vigor físico e intelectual, uma das suas principais características, seria inimaginável que o mister estaria partindo tão precocemente.

Sim, ele era mister Miguel, pela sua sagacidade com as línguas estrangeiras, um poliglota na essência, um escritor, um eterno estudante, um faz tudo, ele se arriscava, ele tinha o verdadeiro espírito juvenil daqueles que têm gana de aprender. Miguel tinha como hobby o xadrez e suas invenções mirabolantes, era uma mente brilhante, um ser diferenciado. Quem o conheceu de perto sabe o que estou dizendo.

Miguel Gonçalves

Sorriso largo, cigarro na boca, o ronco da inseparável motocicleta e a frase de quem se despedia da redação: “Mais alguma coisa senhores?”… Não, Miguel! Não tem mais nada. A gente só queria na verdade que você ainda estivesse conosco. Como tudo é efêmero. Como as despedidas eternas nos fazem refletir sobre o verdadeiro sentido da vida.

Pra quer correr tanto? Pra quer levar problemas tão a sério? Pra quer sorrir quando na verdade queremos chorar?  As máscaras sociais e a vida corporativa nos afastam diariamente dos “Migueis” que temos dentro de nós…Uma sociedade embrutecida não enxerga a beleza nos versos das poesias, nos abraços dos nossos entes queridos, no amanhecer de cada dia, no luar que anuncia o dia que se encerra.

O coração gigante de mister se negou a bater por alguns minutos e o que restou para todos nós foi saudade. Aprender ou vivenciar, cada vez mais, que precisamos fazer o nosso melhor a todo tempo é uma lição que devemos exercitar sempre, pois o sopro da “eternidade” está nos rodeando a cada instante.

Pode parecer pieguice, mas expresse seu sentimento. Mas com respeito, lealdade, carinho e admiração. Uma amizade sincera não se encontra em qualquer esquina, um amigo para todas as horas, as piores horas, na verdade são aqueles de fé, aqueles que na dor da falta, da ausência e do menos sabem estender sua mão e dizer: “Estamos juntos!”

Resistir é a ordem, um companheiro deixa a trincheira, mas continuamos olhando para o horizonte e imaginando que nossas conquistas também são as suas: “Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade”, (Prelúdio/Raul Seixas).

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