A FORÇA DO BOLSONARISMO

Subestimar a obstinação desse movimento de extrema-direita é um erro grave

O Bolsonarismo é um movimento político de extrema-direita que precisa ser levado a sério.

Bolsonaro não surgiu do nada. Ele construiu uma carreira política iniciada em 1989, como vereador, e depois com sete mandatos consecutivos, como Deputado Federal, entre os anos de 1991 e 2018. Foi eleito Presidente da República com 57,7 milhões de votos. Aqueles que subestimam a sua astúcia e oportunismo político cometem um grave erro.

Na campanha para Presidente, Bolsonaro não escondeu quem era. Suas afirmações ecoaram nos meios de comunicação e por mais que a imprensa tentasse de alguma forma desnudá-lo e expô-lo negativamente, foram suas posições radicais que chamaram a atenção de uma parcela do eleitorado que se sentia órfã e que viu nele uma certa paternidade e liderança que lhes faltava. As demais adesões se deram na base da polarização, uma vez que Bolsonaro se colocou como alternativa viável à hegemonia das candidaturas de esquerda.

É preciso entender, portanto, que Bolsonaro não é o resultado dos votos de protesto, como aqueles que tornaram o macaco Tião o terceiro colocado na disputa para o cargo de prefeito da cidade do Rio de Janeiro, em 1988, com cerca 400 mil votos, obviamente sem concorrer ao certame eleitoral.  Ele também não foi objeto da mesma irreverência dos eleitores que levaram Tiririca ao parlamento com mais de 1,3 milhão de votos. Bolsonaro foi eleito pelo voto daqueles que estavam insatisfeitos com os políticos, com a corrupção deslavada estampada nas capas das revistas e jornais, com o desmantelo do Estado brasileiro, com as instituições apodrecidas e com a própria sociedade em estado de degradação. Não se afirma aqui que ele, de fato, represente instrumento para essa mudança. No entanto, foi esse anseio popular que Bolsonaro soube capitalizar e que o levou à Presidência.

Basicamente, dois tipos de eleitores votaram em Bolsonaro. O primeiro deles é composto por pessoas que se identificaram com seu discurso ácido, com suas propostas polêmicas e posições conservadoras. Esses devem ser chamados de Bolsonaristas, por pactuarem com as ideias e forma de agir do atual Presidente da República. Já o segundo grupo é composto por eleitores que, por diversas razões, não queriam mais a continuidade do sistema como estava montando e apostaram nessa candidatura para a promoção das mudanças que desejavam.

Mensurar o tamanho desse eleitorado não é tarefa fácil, mas certamente a quantidade de Bolsonaristas é bem menor do que o grupo composto por conservadores e apoiadores circunstanciais que decidiram as eleições presidenciais de 2018. Muitos desses que votaram em Bolsonaro certamente não votarão nele mais uma vez. Ou já desembarcaram ou estão quase desembarcando dessa candidatura em 2022, cada qual por seus próprios motivos. Um deles é a desconstrução do “mito”.

Basta uma análise rasa para perceber que nos três anos de governo o Bolsonaro do primeiro ano não trilhou os caminhos da política tradicional, evitando acertos políticos, escolhendo ministros técnicos e cumprindo uma agenda liberal, com anúncio de privatizações e redução do Estado. Mas exatamente por esse motivo, sua tímida base no Congresso Nacional não foi eficaz na aprovação de propostas legislativas, o que evidenciou sua fragilidade enquanto governo.

No segundo ano, na tentativa de montar uma base parlamentar mais consistente, o Presidente se aproximou do Centrão formando uma aliança gradativa, cedendo aos poucos ao jogo do chamado “presidencialismo de coalizão”.

No terceiro ano de governo, Bolsonaro ajudou a eleger Arthur Lira para Presidência da Câmara dos Deputados e Rodrigo Pacheco para Presidente do Senado, recriou ministérios, cedeu cargos e, por último, anunciou Ciro Nogueira, presidente do Partido Progressista e líder do Centrão, como comandante da Casa Civil. Bolsonaro chegou mesmo a afirmar “Eu sou Centrão”, assumindo assim a posição e as práticas que negou sistematicamente durante sua campanha. Eis mais um motivo do desembarque de muitos dos seus eleitores.

É preciso ver também que das eleições presidenciais de 2018 para cá, o cenário político mudou muito. A pandemia do coronavírus trouxe variáveis econômicas que aumentaram os gastos públicos e impactaram nas reservas econômicas. O próprio posicionamento pessoal do Presidente diante da pandemia foi alvo de muitas críticas, inclusive de parte do seu próprio eleitorado. Problemas judiciais da família acabaram comprometendo os antigos posicionamentos dos Bolsonaro, que durante a campanha eram a favor da pauta anticorrupção, da prisão após a condenação em segunda instância e contra o foro privilegiado, mas que na prática e em causa própria defenderam justamente o contrário. Mais motivos para o desembarque de parte do eleitorado.

Mas que ninguém se iluda.  Qualquer que seja o tamanho da debandada restará ainda o apoio dos Bolsonaristas, militantes políticos obstinados, com organização coletiva em construção, voz ativa na propagação de suas ideias, alinhados entre si, com disposição à toda prova e convictos de que trilham o único caminho possível para “endireitar” o país.  Subestimar Bolsonaro e seus seguidores tem sido o grande erro daqueles que insistem em desqualificá-lo como o dono de um rebanho de gado e não como o líder de uma frente política mobilizada

O país está agitado, a polarização política ganha contornos bélicos, a ruptura democrática é uma lastimável possibilidade e as instituições estão declaradamente ameaçadas sob pedidos de fechamento do STF e intervenção militar. Diante desse cenário, é preciso seriedade e muita prudência no trato com os Bolsonaristas, além de rigor legal com aqueles que são defensores de pautas antidemocráticas e ameaças golpistas, pois “gado” pasta e é servil até no abate, enquanto esse movimento, ao contrário dessa passividade, marcha destemido para garantir a reeleição de seu líder, custe o que custar.

 

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