Lira omite fazenda e rebanho de gado em declaração à Justiça Eleitoral

Foto: Agência Câmara

Redação*

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), deixou de listar, na declaração de bens enviada à Justiça Eleitoral, uma fazenda de 182 hectares em Pernambuco, da qual o deputado diz ser dono numa disputa judicial, bem como o rebanho de gado de elite, segundo reportagem da Folha de S. Paulo.

Lira declarou ter seis fazendas no interior de Alagoas, mas não listou o imóvel localizado no município de Quipapá. Essa propriedade é alvo de batalha na Justiça entre o deputado e posseiros. O filho de um antigo morador do terreno, no qual funcionava uma usina de cana, pediu à Justiça o usucapião.

A fazenda chegou a ser invadida por sem-terra em 2017 e já esteve na lista de desapropriação para reforma agrária do governo federal, mas a iniciativa acabou revista em 2016. No processo de usucapião em Pernambuco, o deputado também anexou laudos genéticos de animais para mostrar que cria gado na área rural contestada.

Para tentar provar que é dono da fazenda e que os posseiros não têm direito à permanência, advogados de Lira anexaram ao processo um compromisso de compra firmado em 2008 no valor de R$ 350 mil (R$ 793 mil em cifras corrigidas pela inflação).

O contrato envolvia os direitos de herança e meação do antigo proprietário, que havia adquirido parte das terras da antiga usina. Os mesmos papéis haviam sido protocolados à Justiça pernambucana na época da invasão dos sem-terra, em um pedido de reintegração de posse.

As informações sobre bens prestadas não são confirmadas pelas autoridades eleitorais. Há ainda certa resistência dos tribunais eleitorais de aplicar punições mais duras em decorrência da omissão de patrimônio nas declarações dos candidatos.

Outro tipo de propriedade que não aparece nas declarações de bens do deputado neste ano é o seu rebanho. Em 2015, em depoimento em inquérito derivado da Lava Jato, Lira declarou ter posse de 690 cabeças de gado. A última vez que o gado constou especificamente em sua declaração eleitoral de bens, porém, foi em 2006, quando afirmou possuir 240 animais.

Em outra ação na Justiça, sobre um litígio em arrendamento de uma propriedade pelo deputado no município de Campo Alegre (a 80 km de Maceió), ele também anexou comprovantes de propriedade de dezenas de animais.

Lira costuma participar de leilões de gado de elite. Só em um desses eventos, promovido em 2019 em Maceió, constavam para venda 12 bovinos nelore puro de origem em nome do deputado.

Em participação em feira de uma associação do setor no ano passado, foi chamado por um dirigente de “um dos maiores criadores de [gado] nelore do Brasil”.

Também há cavalos em seu nome em ranking de associação nacional de criadores de raça usada em eventos de vaquejada.

Nos anos 2000, a aquisição de gado por Lira foi investigada no âmbito da Operação Taturana, que apurou desvios de dinheiro público na Assembleia alagoana. Lira, inclusive, tem condenação por improbidade decorrente da operação.

Relatório da Polícia Federal de 2008 afirmou que o deputado lavou dinheiro desviado do Legislativo de Alagoas comprando terras e bois. Levantamento policial com empresas de leilões apontou que ele comprou em gado nobre e cavalos, de 2005 a 2008, R$ 1 milhão (R$ 2,2 milhões em valores corrigidos pela inflação).

Em agosto, reportagem da Folha mostrou documentos que apontam que o deputado alagoano deixou de declarar à Justiça Eleitoral em 2018 a aquisição dos direitos de outras duas fazendas no interior de Alagoas. Os registros mostram que o parlamentar desembolsou na época R$ 728 mil (R$ 955 mil em valores corrigidos).

As duas fazendas, chamadas de Paudarqueiro e Tapera, ficam no município de São Sebastião, a 120 km de Maceió. Na declaração de bens deste ano, as duas propriedades aparecem na lista, mas em valor bem inferior ao informado nos papéis do cartório. Foram declaradas apenas “parte do pagamento” por esses imóveis, no valor de R$ 230 mil.

Os documentos finais concretizando a transação, datados do início deste ano, afirmam que os dois imóveis valem juntos R$ 690 mil. Nessas terras e na fazenda de Quipapá, há centenas de cabeças de gado, conforme constatou a reportagem quando esteve na região em julho.

Lira informou neste pleito possuir um total de R$ 5,965 milhões em bens, um acréscimo de 170% sobre o declarado há quatro anos (R$ 2,2 milhões, corrigidos pela inflação do período).

Dentre o patrimônio declarado pelo deputado, R$ 1,1 milhão é relativo à empresa do deputado, a D’Lira Agropecuária. Esse montante inclui as cotas da companhia, um empréstimo de R$ 756 mil à firma e uma quantia destinada a “aporte para aumento de capital”.

O bem mais valioso declarado por Lira é uma casa no município de Barra de São Miguel, no litoral alagoano, onde seu pai, Benedito de Lira, é prefeito. O imóvel foi declarado à Justiça Eleitoral por R$ 1,2 milhão.

A Folha procurou Lira por meio de sua assessoria e enviou perguntas sobre a declaração de bens, mas não houve resposta. Em julho, ele afirmou, sobre seu patrimônio, que adquiriu tudo “dentro da normalidade, com recursos provenientes de quase 40 anos de trabalho e investimentos corretos”.

*com Folha Press

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