Prisões crescem 18% em Alagoas, com mais de 6 mil casos este ano

Igor Lessa / Ascom PM-AL

Era uma noite de quinta-feira, quando a Patrulha Maria da Penha (PMP), unidade Agreste, recebeu um chamado em Arapiraca. Um homem de 26 anos havia passado o dia ameaçando e perseguindo a ex-companheira, de 24 anos, no trajeto dela ao trabalho, descumprindo medida protetiva de urgência, em 11 de setembro de 2025. A equipe policial encontrou o agressor em frente à residência da vítima, tentando forçar o diálogo. Durante abordagem, acharam duas facas tipo peixeira na cintura dele. Os militares conduziram o infrator à Central de Polícia Civil de Arapiraca, onde foi autuado flagrante.

Essa ocorrência é um retrato de uma tendência em todo o estado: o aumento de prisões efetuadas pela Polícia Militar de Alagoas (PM-AL). Entre janeiro e setembro de 2025, a corporação efetuou 6.234 prisões, frente a 5.281 no mesmo período do ano passado – um incremento de 18%, equivalente a 953 novas capturas.

Entre os crimes com maior frequência percentual de prisões nos dois últimos anos estão ameaça (50,9%), violência contra a mulher (41,1%) e furto (29%), segundo levantamento da Seção de Estatística e Ciência Aplicada da PM-AL.

Ao se verificar o volume total de prisões, a violência contra a mulher aparece em primeiro lugar, com 938 capturas em 2024 e 1.324 em 2025. Em seguida, vem tráfico de drogas (744 e 920), cumprimento de mandado judicial (551 e 703) e embriaguez ao volante (299 e 311).

Dessa maneira, tanto a variação percentual quanto o volume absoluto de prisões demonstram o avanço da Polícia Militar no enfrentamento à violência doméstica em Alagoas, sem deixar de evidenciar a atuação em outras frentes criminais.

A média mensal de prisões subiu 18% – de 586 para 692 –, com crescimento em todos os meses de 2025 em relação ao ano passado. Esse aumento, conforme a PM-AL, revela um padrão progressivo e consistente. O resultado reflete uma gestão estratégica e operações mantidas ao longo do tempo. As altas mais expressivas foram observadas em agosto (44,2%), junho (32,4%) e julho (21,4%), períodos com maior fluxo populacional, em virtude das férias escolares e dos festejos juninos.

O relatório da Seção de Estatística e Ciência Aplicada da PM-AL aponta ainda que a quinta-feira concentrou o maior crescimento percentual de prisões (aproximadamente 31%), seguida da sexta-feira (cerca de 25%), enquanto o domingo teve a menor (em torno de 11%). No entanto, houve aumento geral de capturas em todos os dias da semana, com picos mais altos próximos aos finais de semana.

Considerando todas as ocorrências atendidas pela PM-AL, a maioria se deu no turno da noite, com 407 prisões adicionais em 2025.

Na avaliação do comandante-geral da Polícia Militar, coronel Paulo Amorim, a presença efetiva do patrulhamento em todo o estado contribui positivamente para os resultados. “O policiamento é focado na abordagem a pessoas e veículos. Intensificamos ações preventivas e operações constantes nas ruas da capital e nas cidades interioranas. Isso faz a diferença”, afirmou.

O comandante-geral da PM-AL explicou que os números de 2024 já mostravam intensa movimentação de atividades criminosas entre quinta e domingo. Em geral, nesse período da semana há mais deslocamentos para lazer, visitas a familiares ou a amigos, bares e festas. “Em muitos desses casos, o consumo de álcool e drogas é acentuado aos finais de semana, podendo gerar brigas, ameaças, violência doméstica, dentre outros delitos, resultando em prisões independentemente da natureza do crime”, especificou.

Os municípios de Palmeira dos Índios, Rio Largo e Arapiraca registraram crescimento superior a 50% nas prisões, indicando expansão das ações policiais para além de Maceió. Apesar do aumento acima de 12%, a capital permanece na liderança em número total de capturas.

Para se ter uma ideia, entre janeiro e setembro de 2025, as guarnições militares prenderam 2.327 pessoas em Maceió, superando as 2.077 no mesmo intervalo de 2024, isto é, 250 prisões adicionais. Em Palmeira dos Índios, Rio Largo e Arapiraca, os acréscimos foram de 62, 79 e 178, respectivamente.

Esses quatro municípios, os mais populosos de Alagoas, segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), concentram 569 das 953 novas prisões realizadas no recorte temporal analisado.

A resposta à criminalidade e, em especial, à violência doméstica, de acordo com o coronel Paulo Amorim, deve-se à capilaridade do policiamento e ao padrão operacional da PM-AL em todo o estado, bem como à continuidade das ações integradas entre as forças de segurança pública.

O domínio de homens nos registros policiais

Na situação de Arapiraca, a guarnição da PMP/Agreste chegou à casa da vítima por volta das 19 horas após nova ligação telefônica feita por ela, contou o cabo Lucas Primo. “Não foi necessário à denunciante dizer uma palavra sequer, pois naquele dia houve duas ligações anteriores. Nelas, a mulher assistida descreveu o agressor na frente do local de trabalho dela, aguardando o horário de sua entrada/saída. Nesses dois acionamentos, a guarnição não teve êxito em prendê-lo, porque ele conseguiu fugir de motocicleta”, relembrou o militar.

O agressor estava de costas para a rua, de frente para a vítima e diante dos quatro filhos do ex-casal. A mulher e os menores foram orientados a entrar em casa enquanto durava a revista pessoal. Em seguida, a guarnição levou o homem à Central da Polícia Civil. Ele pode responder pela conduta ilícita prevista no artigo 24 da Lei Maria da Penha (descumprimento de medida protetiva de urgência), com pena de detenção de três meses a dois anos.

O sexo masculino representa a maioria das prisões, em Alagoas, para todos os tipos de infração penal. Das 6.234 capturas acumuladas neste ano, 5.766 envolveram homens. Foram 2.157 somente em Maceió. Tomando por referência o crime de violência doméstica na capital alagoana, as detenções masculinas lideram o ranking com 609 em 2025, à frente do tráfico de drogas (353) e do cumprimento de mandados judiciais (253).

A comandante da Patrulha Maria da Penha da Polícia Militar (PMP/PM-AL), major Dayana Queiroz, pondera que o crescimento de prisões em situações de violência doméstica não representa necessariamente um aumento real das ocorrências. Apesar dos mecanismos, da legislação e da estrutura de serviços especializados, muitos casos ainda não são reportados às autoridades competentes, como as forças policiais ou os serviços de proteção, saúde e assistência social.

Esse avanço, conforme a major, não deve ser interpretado isoladamente, mas como resultado de um conjunto de fatores. Dentre eles, destacam-se o fortalecimento da confiança das vítimas em denunciar, o conhecimento delas sobre seus direitos e as possíveis consequências para os autores dos crimes.

“A divulgação contínua da Lei Maria da Penha, que já tem 19 anos de implementação, e dos mecanismos de proteção, somada à disseminação de informações pelas redes sociais, é fundamental, mas ainda há um desconhecimento significativo”, explicou.

Ela acrescentou ainda que outros aspectos de ordem pessoal influenciam, como o temor pela vida da própria denunciante e o receio de retaliações do ex-companheiro. A vergonha de expor o fracasso do relacionamento, a decepção em relação às expectativas de uma vida familiar idealizada e a dependência emocional, comum nesses episódios, também contribuem para esse cálculo.

Responsável pelo policiamento em Arapiraca, o 3º Batalhão de Polícia Militar (BPM) intensificou a atuação no enfrentamento à violência doméstica com o trabalho de inteligência alinhado ao apoio da PMP/Agreste, garantindo a localização rápida de agressores e o acompanhamento contínuo das mulheres assistidas.

Para o comandante da unidade, o tenente-coronel Carlos Alberto de Albuquerque, o alinhamento entre as guarnições ordinárias e as equipes específicas da patrulha proporciona maior cobertura territorial e atenção ampliada às mulheres em situação de vulnerabilidade, inclusive àquelas que ainda não dispõem de medidas protetivas.

“O 3º BPM mantém ainda estreita parceria com o Ministério Público, o Poder Judiciário e a rede de proteção social, assegurando a efetividade das ações e o acolhimento humanizado às vítimas. Essa integração entre instituições resulta em prisões de infratores reincidentes, redução significativa de casos graves e fortalecimento da confiança da comunidade na atuação da Polícia Militar no enfrentamento à violência doméstica e familiar”, detalhou o tenente-coronel Carlos Alberto.

Por que o crime de ameaça lidera as estatísticas?

Entre os crimes com mais prisões em Alagoas, a ameaça se destaca não somente pela frequência, mas também por sua ligação direta com caso de violência doméstica.

O crime de ameaça, tipificado no artigo 147 do Código Penal (CP) brasileiro, corresponde a “ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave”. A pena é de detenção de um a seis meses, ou multa.

Na prática, a guarnição policial lavra o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) no local dos fatos, e vítima, acusado e testemunhas são liberados ao fim do procedimento. Posteriormente, as partes são convocadas ao Juizado Especial Criminal (JECrim), órgão responsável por julgar infrações de menor potencial ofensivo, como ameaça, perturbação do sossego alheio e dano ao patrimônio alheio.

O TCO é uma ferramenta para as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não ultrapasse doisanos, não necessitando a condução do acusado à delegacia para apresentar o flagrante e nem a abertura de inquérito policial, feito nos casos de homicídio e tráfico de drogas.

Por que, então, a ameaça aparece com a maior porcentagem de prisões efetuadas pela PM em Alagoas de janeiro a setembro, nos anos de 2024 e 2025?

A ameaça costuma vir associada a crimes mais sérios, a exemplo do porte ilegal de arma de fogo, roubo e de homicídio.

No 10º BPM, localizado em Palmeira dos Índios, a gestão entende todos os crimes de menor potencial ofensivo como indicativo de maior atenção das forças de segurança. Para o subcomandante do Batalhão, capitão Jesus Teles, o delito de ameaça tende a servir de sinal de alerta para situações de risco iminente.

“Conflitos interpessoais, se não forem contidos a tempo, podem evoluir para agressões físicas ou até homicídios. A ameaça funciona como uma porta de entrada para delitos mais graves e, por isso, uma intervenção policial antecipada impede a escalada da violência”, relatou.

É semelhante à forma do 3º BPM tratar o policiamento voltado ao combate do crime de ameaça em Arapiraca. Nas palavras do tenente-coronel Carlos Alberto de Albuquerque, a atuação coordenada entre a inteligência e as guarnições ostensivas permite identificar padrões de comportamento, mapear áreas de alta incidência, localizar infratores e neutralizar riscos antes que evoluam para atos ilícitos de maior gravidade.

“A elevação das prisões, portanto, evidencia eficiência operacional e aperfeiçoamento do sistema de resposta, e não somente crescimento da criminalidade”, completou o comandante do 3º BPM.

No contexto da violência doméstica e familiar, o crime de ameaça ganhou nova interpretação desde 9 de outubro de 2024. A lei nº 14.994/24 fez duas mudanças no artigo 147 do CP. A primeira foi o aumento da pena, que agora dobra o tempo de detenção, sendo de dois meses a um ano ou multa. Já a segunda alteração tornou a ação penal pública incondicionada, isto é, o ex-companheiro pode ser conduzido à delegacia pela Polícia Militar e, a partir daí, o inquérito policial pode ser instaurado mesmo sem a manifestação da denunciante em prosseguir com a acusação.

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025 divulgou dados de violência doméstica no país. Houve alta percentual em todos os crimes contra a mulher. O único com queda nos registros foi ameaça (0,8%). Já em Alagoas, o número cresceu 6,4%.

A major Dayana Queiroz esclarece que incremento não indica mais casos de ameaça, e sim maiores notificações por parte das vítimas alagoanas.

“Há uma tendência do agressor, ao tomar conhecimento de que a mulher teve coragem, denunciou, fez boletim de ocorrência e solicitou medida protetiva, já reagir, cometendo novos crimes, inclusive o de ameaça. É uma conduta reiterada, ele faz pessoalmente e também por meios virtuais. Então, é comum o infrator ameaçar a ex-companheira após a efetivação da denúncia.”

Ela ressaltou ainda: quando a medida protetiva não está vigente, o agressor que cometer novo ato infracional, feito ameaça ou outra infração, é conduzido à delegacia da mesma forma. “Não pelo descumprimento da medida protetiva, mas pelo novo ato ilícito. Esse detalhe altera a dinâmica da atuação policial e é observado com atenção pelos nossos agentes”, acrescentou.

A denúncia (inclusive anônima) pelo número 181 é um passo essencial no enfrentamento à violência contra a mulher, associada ou não à ameaça. O capitão Jesus Teles comentou que a postura da Polícia Militar é de tolerância zero a esses crimes. A cooperação com o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública potencializa a atuação das equipes policiais (ordinárias e Patrulha Maria da Penha), atuando em menor tempo no acompanhamento das medidas protetivas de urgência.

“Intensificamos as ações de fiscalização, visitas preventivas e as campanhas educativas voltadas à conscientização da comunidade sobre a importância de denunciar casos de violência. Investimos também na capacitação dos policiais para o atendimento humanizado e especializado dessas ocorrências e, com isso, as respostas são mais rápidas e eficazes”, destacou o subcomandante do 10º BPM.

Interiorização das prisões: o caso do Agreste

Todos os Comandos de Policiamento, responsáveis pelos municípios do interior de Alagoas, apresentaram crescimento proporcional em prisões. O da Região Agreste (CPRA) registrou a maior variação: 40%, seguido da Região Sul (CRPSul) com 28%.

Além de Arapiraca e Palmeira dos Índios, cidades como Marimbondo, Feira Grande, Cajueiro, Cacimbinhas, Minador do Negrão, Tanque D’Arca, Lagoa da Canoa, Olho D’Água Grande, entre outras, integram o CPRA. Todos esses municípios tiveram altas nas prisões, reforçando a presença operacional da Polícia Militar fora da capital de Alagoas.

Essa alta de prisões aponta uma atuação efetiva e eficiente, com um amplo acompanhamento dos índices criminais, análise e tratamento dos dados, e consequente direcionamento do efetivo de policiais para os locais mais críticos. Esse trabalho também fortalece a confiança por parte da população para fazer novas denúncias.

O comandante do CPRA, tenente-coronel Anaximandro Tenório, esclarece que as estratégias utilizadas na Região Agreste estão alinhadas à política do Comando-Geral da PM-AL, com foco na ostensividade, intensificação das rondas, reforço das abordagens e atenção especial aos delitos de menor potencial ofensivo, com lavratura do TCO.

“O delito não é só uma questão de lei, é também um reflexo do que acontece na sociedade. Fatores como o crescimento da população, o aumento do movimento nas cidades e a circulação de dinheiro influenciam diretamente esses números. Arapiraca, por ser o município mais populoso da nossa região, naturalmente acaba se destacando nas estatísticas”, explicou.

O comandante lembra que muitos desses atos ilícitos, em particular as ameaças no cenário doméstico, exigem atuação imediata para evitar agravamentos.

Crimes com baixa resolutividade ou sem registros oficiais podem servir como porta de entrada para delitos mais graves. De acordo com o tenente-coronel Anaximandro Tenório, a gestão do CPRA vem trabalhando para orientar os policiais, principalmente os que estão nas ruas, na segurança direta à população, a exercerem suas funções com maior firmeza e respaldo legal na prevenção e fiscalização dos delitos de menor potencial ofensivo, a exemplo das ameaças.

“O Termo Circunstanciado de Ocorrência tem sido um importante instrumento nesse trabalho, pois a PM tem dado uma resposta rápida e eficaz a esses crimes, lavrando o procedimento no próprio local do fato e restabelecendo, assim, a normalidade e a sensação de segurança da comunidade”, finalizou.

/Ascom PM-AL

 

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