Leonardo Ferreira
Três anos. Esse é o tempo em que a sociedade alagoana e a família do ativista político e empresário Kleber Malaquias, morto a tiros numa emboscada em 2020, aguardam a principal questão envolvendo o crime: quem foi o mandante? Dia 15 de julho, em pleno aniversário, ele foi assassinado no Bar da Buchada, em Rio Largo.
De lá para cá, a Polícia Civil indiciou e o Ministério Público denunciou seis pessoas acusadas de participação no homicídio e que foram presas preventivamente. O autor intelectual, porém, continua desconhecido, mesmo com as próprias autoridades reconhecendo que se tratou de um crime de mando, pelas inimizades de Kleber por suas acusações recorrentes contra políticos.
Foi prometido empenho na complexa investigação, mas sem frutos até então. A impunidade permanece. Em relato, a mãe Evany Malaquias lamenta a falta de respostas. Em junho, ela sofreu mais um baque: a morte do esposo Cícero Malaquias, pai de Kleber.
“No próximo dia 15 de julho seria o aniversário de nascimento de Kleber, mas se tornou a triste data de três anos do seu assassinato covarde e cruel. E até essa data, o governo de Alagoas não prendeu quem mandou matar, mesmo tendo na investigação indícios de envolvimento de uma autoridade. É uma vergonha para Alagoas não solucionar esse crime”, desabafou Evany.
Aos prantos, ela conta que Cícero entrou em depressão depois da morte do filho. “Os mandantes rindo de todos nós e nada foi feito até agora. Nem delegado quer mais falar comigo, não responde. Meu marido há 46 anos não suportou tanto desgosto”, disse.
Desde que a denúncia chegou ao Judiciário, há dois anos, o processo corre em segredo de justiça. No entanto, por meio do Diário da Justiça Eletrônico, é possível conferir o andamento de trechos da ação. Nos últimos anos, as defesas dos seis acusados têm se dedicado à tentativa de soltura deles, num processo que ainda deve se arrastar até o possível julgamento.
A última publicação data recentemente de 07 de julho, após a realização de audiência de acareação e a manutenção das prisões preventivas de quatro acusados e a prisão domiciliar de outro, que se somam a outro preso em domicílio. O processo tramita na 3ª Vara de Rio Largo.
A trama
Com base na denúncia feita após apuração policial, a Folha vai relembrar todos os detalhes que levaram àquela fatídica quarta-feira à tarde. A investigação se baseou em análise de câmeras, quebras de sigilo e perícias. No processo, quatro acusados negam participação na execução, e os outros dois adotaram o direito constitucional de permanecerem em silêncio.
A denúncia aponta que, de forma ardilosamente arquiteta por José Mario de Lima Silva, Edinaldo Estevão da Silva, Jefferson Roberto Serafim da Rocha e Marcos Maurício Francisco dos Santos, a vítima Kleber Malaquias foi assassinada com disparos deflagrados por Fredson José dos Santos, o qual contou com o apoio, durante toda a ação, de Marcelo José Souza da Silva.
Os dois últimos sendo ex-policiais militares. Já Jefferson e Marcos foram os responsáveis por monitorar os passos de Kleber naquele dia, deixando Fredson e Marcelo bem informados. Também serviram de apoio José Mário, que é sargento da PM, e Edinaldo, este foi quem conseguiu atrair a vítima.
Primeiro, Marcos tentou, sem êxito, marcar um encontro com Kleber, para falar sobre um ponto comercial localizado na cidade. Na sequência, foi a vez de Edinaldo tentar convencê-lo a sair de casa, conforme mensagens encontradas no celular, sob a justificativa de que o sargento Mário, então pré-candidato a vereador, gostaria de falar sobre questões políticas.
Durante 10 dias, Edinaldo ficou em conversas com Kleber, até que o convenceu do encontro, prometendo pagar a cerveja pelo aniversário da vítima. Exatamente no dia 15, por volta de 10h, Edinaldo e Kleber se encontram numa praça e depois, cada um no seu carro, vão a uma loja de conveniência de um posto próximo ao viaduto que dá no Aeroporto Zumbi dos Palmares. Antes, os acusados trocaram diversos telefonemas.
Edinaldo, então, avisa Marcos e Jefferson para que eles se dirigissem até Rio Largo. Isso num Renault Sandero, veículo no nome de Jefferson. Às 11h, a dupla se junta a Edinaldo e Kleber no posto e começa a consumir bebidas alcoólicas. Em outro carro, um Volkswagen Gol, vão até a cidade os autores materiais: Fredson e Marcelo.
Esses últimos, porém, não vão ao posto, mas estão em contato com os que lá estão. Logo depois, também chega ao posto o sargento Mário, numa moto, e se junta à conversa do grupo, deixando o local na sequência. Por volta de 13h, Kleber leva o seu carro para casa e volta ao estabelecimento de mototáxi.
Execução e fuga
É aí que decidem ir ao Bar da Buchada. No mesmo carro estavam Kleber, Marcos, Jefferson e Edinaldo. Eles se sentam em uma mesa próxima à sinuca. Os acusados continuam a se comunicar com os executores. Às 14h10, chegam ao bar Fredson e Marcelo, que escolhem uma mesa no canto esquerdo. Nesse período, pedem refrigerante, vão ao banheiro, simulam telefonemas.
Quando dá quase 15h, Kleber pede a conta e decide ir ao banheiro. Nesse instante, ele é surpreendido por Fredson, o qual saca a pistola e dispara no abdômen da vítima, que cai no chão. Em seguida, efetua outro tiro na têmpora e finaliza o homicídio.
Na saída do bar, Fredson ainda faz gesto de silêncio para uma testemunha e vai embora com Marcelo, sendo seguidos por uma camionete Toyota Hilux branca, guiada por Vanildo Rufino dos Santos, vereador de Rio Largo e cassado por compra de votos, rumo a Maceió. Ele também é investigado. A correria chama a atenção de quem passa pela movimentada rua.
Ante o relatado e o histórico de Kleber, a denúncia concluiu por ser um crime de mando. “No entanto, não restou possível, até o momento, identificar acima de qualquer dúvida razoável a autoria intelectual do referido homicídio, razão pela qual prosseguem as investigações justamente com esse fim”, diz o texto.