Ponto de equilíbrio. A relação do senador Renan Calheiros (MDB) com os poderes é o que o torna favorito para assumir o comando do Senado mais uma vez. “Bolsonaristas” mais radicais torcem o nariz para tal possibilidade, mas o trânsito que Calheiros possui na República é inegável e invejável por outros tantos.
Nos corredores obscuros de Brasília o receio de mais uma crise institucional começa a pairar, a falta de habilidade política do presidente Jair Bolsonaro (PSL) é escancarada. Seu perfil desagregador não condiz com as melhores condições para manter a governabilidade.
Em tom de aglutinação e maturidade política, o senador eleito pelo Rio de Janeiro e filho do presidente, Flávio Bolsonaro, deu um aceno público para Calheiros durante entrevista: “O governo tem que conversar com todo mundo que foi eleito. Óbvio que a gente tem que buscar, dentro da possibilidade, qualquer pessoa que seja convergência dentro do Senado”.
Flávio ainda colocou: “O Renan nem colocou oficialmente a candidatura ainda, como descartar um apoio que nem existe? O primeiro passo é ouvir todo mundo. O Renan foi eleito, outros foram eleitos e são bons nomes e quero conversar com todo mundo.” No entanto, Flávio não descarta a formação de blocos partidários para fazer frente à legenda. “O MDB é quem vai indicar, se eles forem a maior bancada realmente, se não houver uma composição de novos blocos que podem vir a ter preferência na indicação para o presidente”.
Renan já foi presidente da Casa em três períodos, 2005 a 2007, de 2013 a 2015 e de 2015 a 2017, enfrentou perseguições políticas e exerceu o protagonismo nos governos Lula e Dilma. O senador alagoano ainda responde a várias acusações de crime. A vida no Senado de Renan, desde 1995, é repleta de capítulos agitados.
Após seu nome ser ventilado e parte da cúpula do MDB nacional convergir para sua candidatura, Renan segue em silêncio. Se expor agora pode ser ruim para suas pretensões. A reportagem da Folha de Alagoas fez contato com assessoria do senador em Brasília para questionar “como Calheiros estava avaliando tal cenário?”, sem muitas explicações, a resposta foi que o senador não falaria nesse momento.
Em busca da presidência
Ao contrário de Renan, o deputado João Henrique Caldas (PSB), o JHC, esteve na residência do presidente eleito, Jair Bolsonaro, no Rio de Janeiro, para manifestar sua intenção de disputar o comando da Câmara Federal. Em seu futuro segundo mandato, já que foi reeleito, o parlamentar alagoano se tornou, proporcionalmente, o deputado federal mais votado do Brasil.
JHC dialoga bem com as redes sociais, conseguiu consolidar um eleitorado em Alagoas e não teve sua imagem atrelada ao do pai, João Caldas, político tradicional no Estado.
Em contato com a reportagem da Folha, JHC falou detalhes da sua visita ao futuro presidente Bolsonaro e destacou a possibilidade de possíveis apoios. Confira a íntegra:
Folha de Alagoas – Por que o desejo de presidir a Câmara Federal?
JHC – Há um bom tempo a Câmara tem sido vista como “puxadinho” do Executivo, ora com presidências subservientes ao Poder Executivo, ora com administrações oposicionistas. A minha ideia é resgatar a institucionalidade do cargo. Isto é: dar à Câmara uma gestão independente, para que o Poder Legislativo retome seu papel constitucional de ponto de equilíbrio entre os Poderes e a sociedade. Sem fisiologismo ou toma lá dá cá. Sem permitir que outros poderes interfiram diretamente na pauta, mas também evitando que se pautem questões apenas para criar constrangimento ou dificuldades ao Executivo ou Judiciário. A ideia é, portanto, uma administração estritamente técnica e constitucional, para que se evite a hipertrofia de outros poderes em detrimento do Legislativo. A sociedade tem que se enxergar em seus representantes, afinal foram eles que elegeram os deputados e senadores. É um projeto impessoal e suprapartidário, constitucional e de resgate da independência harmônica e equilibrada entre os Poderes.
Quais as lideranças/partidos que apoiam essa possível candidatura?
A ideia da candidatura nasceu justamente de questionamentos espontâneos de algumas lideranças, muito em razão da nossa atuação enquanto terceiro-secretário e pela votação expressiva que Alagoas me deu. Apontar nomes, neste momento, seria precipitado porque ainda há muito nesta legislatura para ser feito.
O senhor tem o apoio do PSB nacional para essa empreitada?
Algumas lideranças partidárias já assinalaram com o apoio, porém o PSB é um partido que tem uma verve democrática muito forte, então essa construção, seara intrapartidária, tem uma dinâmica própria. A ideia é trabalhar nesta legislatura para que, iniciado o próximo ano, haja uma formalização desse apoio.
O senhor esteve essa semana com o presidente eleito Jair Bolsonaro. Quais pautas os senhores trataram nesse encontro? Ele apoia sua possível candidatura?
Estive com o presidente eleito Jair Bolsonaro para informar-lhe da minha intenção de concorrer à Presidência da Câmara dos Deputados. É um projeto impessoal e suprapartidário, constitucional e de resgate da relação harmônica e, especialmente, independente dos poderes. A conversa vem na esteira dessa institucionalidade, por isso a necessária transparência. Ao contrário do que foi divulgado, a ideia não é pedir “benção”, mas estabelecer desde já um diálogo no nível institucional.
Seu protagonismo eleitoral e agora político em Brasília lhe credencia a disputar a prefeitura de Maceió?
Em decorrência da nossa história e desempenho eleitoral é natural que essa possibilidade seja ventilada, no momento penso apenas em encerrar o mandato da melhor forma possível e iniciar a próxima legislatura com ainda mais disposição para trabalhar por Alagoas e pelo Brasil.
Uma possível eleição de Renan Calheiros, para presidir novamente o Congresso, atrapalharia em que sentido seu protagonismo?
Não penso em “protagonismo”. A ideia de comandar a Câmara não é um projeto pessoal, mas institucional. Essa tem sido a tônica da minha vida pública.
JHC é verdade que o senhor pode presidir PSL em Alagoas?
Não há qualquer movimento nesse sentido. Sinto-me prestigiado no PSB e, embora não convirja integralmente, possuo identidade com várias pautas históricas do partido.
Como o senhor avalia as gestões do governador Renan Filho e do prefeito Rui Palmeira até aqui?
Em ambos os casos me incomoda muito a ausência de um pensamento transformador, especialmente na capital. Nesses quase oito anos, do ponto de vista de conceito, nada mudou em Maceió. Demos uma contribuição no início do primeiro mandato, mas a postura da Administração é bastante vacilante, o que tornou a parceria inviável. No Estado, apesar de alguns dados técnicos interessantes, especialmente dentro do contexto nacional, a ideia é a mesma. Nossas principais matrizes econômicas – construção civil e sucroenergético – agonizam em crises sem precedentes, não enxergamos nenhum movimento objetivo para resgatar esses setores ou mesmo viabilizar alternativas. A ideia é basicamente recapear estradas e concreto. Essa é uma crítica construtiva. Infelizmente a gestão de Maceió deve manter essa linha até o fim do mandato, entregando ao sucessor praticamente a mesma cidade que encontrou há oito anos. Espero que a administração estadual faça justiça ao grande número de votos recebidos e realize ao menos parte do que prometido em 2014. No que puder ajudar, enquanto parlamentar, irei fazer.
Jornal Folha de Alagoas