A blindagem às emendas de relator na sanção do Orçamento consagra o domínio do centrão sobre os cofres do governo, justamente em ano de eleições.
O presidente Jair Bolsonaro (PL) vetou R$ 3,2 bilhões em despesas de custeio e investimentos de ministérios, atingindo verbas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), de combate a incêndios florestais, entre outros.
A tesourada, porém, poupou R$ 16,5 bilhões reservados para emendas de relator, instrumento usado para irrigar redutos eleitorais de parlamentares aliados ao Palácio do Planalto.
O valor se soma aos R$ 16,8 bilhões já reservados pela Constituição para as chamadas emendas individuais e de bancada, que têm critério mais equânime de distribuição entre aliados e membros da oposição.
Em ano eleitoral, a expectativa de técnicos do Ministério da Economia é a de que haja pressão pelo empenho do maior volume possível de emendas ainda no primeiro semestre, para evitar as restrições eleitorais.
A avaliação encontra eco no Congresso Nacional, onde parlamentares da base contam com os recursos das emendas para aumentar suas chances de reeleição.
O empenho é a primeira fase do gasto, quando o governo sinaliza o compromisso com determinada obra, compra ou contratação de serviço.
A lei eleitoral diz que, nos três meses que antecedem o pleito, é vedado realizar transferências voluntárias de recursos a estados e municípios. As emendas se enquadram nesse caso, segundo os técnicos.
A única exceção é quando os recursos servem para garantir a execução de obra ou serviço já em andamento, com cronograma definido, ou para atender a situações de emergência ou calamidade pública.
Dessa forma, empenhos de novas despesas terão de ser feitos até 1º de julho, ou após as eleições. Apesar disso, integrantes do Planalto afirmam que há interpretações divergentes e que alguns tipos de empenho poderiam ser feitos no período eleitoral.
Um estudo publicado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados em julho de 2020 indica que as chamadas transferências especiais —emendas usadas para repassar dinheiro diretamente a estados e prefeituras sem destinação específica— também se sujeitam às restrições eleitorais.
O Tesouro Nacional, responsável pelo repasse dessas transferências especiais, informou que uma consulta feita à PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) indicou conflito com a lei eleitoral.
“Informamos que as emendas parlamentares individuais, na modalidade transferências especiais, se enquadram no critério de transferência voluntária descrito na lei eleitoral, que veda esse tipo de repasse nos três meses que antecedem as eleições”, disse o órgão.
Até a publicação deste texto, a PGFN não respondeu sobre as demais emendas.
Os ministérios já começaram um movimento embrionário de definição de gastos prioritários para o ano. Os levantamentos serão repassados à Casa Civil, chefiada por Ciro Nogueira.
Nogueira é senador pelo PP e um dos caciques do centrão, bloco de partidos que dá sustentação política a Bolsonaro no Congresso. Sua nomeação para a Casa Civil, responsável pela coordenação de governo, foi uma tentativa do presidente de melhorar a interlocução com os parlamentares.
Hoje, o ministro-chefe da Casa Civil tem o poder da caneta na execução do Orçamento. Um decreto de Bolsonaro conferiu à pasta a atribuição de dar “aval prévio” a quaisquer mudanças empreendidas pelo Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes.
Folha Press