Luciana Santana*
Como é sabido, a força do PT nas eleições estaduais é muito relevante na região Nordeste, e tem peso considerável para a eleição presidencial. Nacionalmente, o aumento do desempenho do partido fica nítido a partir da eleição de 2002, e, desde 2014, tem se mantido no mesmo patamar de votos recebidos, como podemos observar no gráfico abaixo. Vale lembrar que, na eleição em que concorreu Fernando Haddad, em 2018, e na eleição de Lula, em 2022, o partido petista venceu em todos os 9 estados da região.
A força petista em estados nordestinos é relevante
Nas eleições estaduais de 2002, quando o PT já contava com a alagoana Heloísa Helena no Senado, o crescimento do partido ganha força com a eleição de Wellington Dias para o governo do Piauí. Antes disso, o PT só tinha eleito um senador, em 1994, com José Eduardo Dutra, por Sergipe. Na eleição de 1994 e de 1998, o PT não teve nenhum governador eleito na região.
Em 2006, Jaques Wagner venceu sua primeira eleição para governador da Bahia, Wellington Dias foi reeleito no Piauí e Marcelo Déda foi eleito em Sergipe. Em 2010, Jaques Wagner e Marcelo Déda foram reeleitos como governadores nos estados da Bahia e Sergipe, respectivamente. E o PT obteve 4 cadeiras no Senado Federal, com Walter Pinheiro pela Bahia, Humberto Costa, por Pernambuco, José Pimentel, no Ceará, e Wellington Dias, pelo Piauí. Em 2014, Rui Costa é eleito governador da Bahia, Camilo Santana do Ceará, e Wellington Dias volta a governar o estado piauiense pela terceira vez. Naquele ano, a única senadora eleita pelo partido na região foi Fátima Bezerra (RN).
Já em 2018, ano em que todos os governadores eleitos na região Nordeste eram de partidos de centro-esquerda, o PT elegeu 4 governadores, Fátima Bezerra foi eleita pela primeira vez no Rio Grande do Norte, e os governadores Camilo Santana, no Ceará, Wellington Dias, no Piauí, e Rui Costa, na Bahia, foram reeleitos para o segundo mandato. Na última eleição, esse desempenho se manteve, e o partido elegeu 4 dos 9 governadores da região: Bahia, com Jerônimo Rodrigues, Elmano de Freitas, no Ceará, Rafael Fonteles, no Piauí, e Fátima Bezerra foi reeleita no Rio Grande do Norte. Além disso, dois ex-governadores do PT conseguiram ser eleitos para o Senado Federal, Camilo Santana (CE) e Wellington Dias (PI), além de Teresa Leitão como senadora por Pernambuco.
E nas capitais? O PT não tinha o mesmo protagonismo
Diferentemente do desempenho nas eleições presidenciais e estaduais, o protagonismo petista nas capitais nordestinas sempre foi mais restrito, o que aponta para um perfil de eleitorado com maior alinhamento às outras forças partidárias de centro-esquerda na região ou aos partidos mais à direita.
Para ter um histórico sobre o desempenho do PT, é importante olhar para a situação do partido nas capitais desde sua criação. A primeira vitória do PT em uma capital nordestina foi em 1984, com Maria Luiza Fontenelle, prefeita de Fortaleza. Depois dessa eleição, apenas em 2000 o PT voltou a ter uma gestão municipal em capitais da região, ao eleger João Paulo em Recife e Marcelo Déda em Aracaju. Ambos foram reeleitos em 2004. Luizianne é reeleita em Fortaleza, em 2018, e João da Costa se torna prefeito do Recife. Em 2012, Luciano Cartaxo foi eleito por João Pessoa e deixou o partido quando disputou a reeleição em 2016, pelo PSD. Ele retorna ao partido em 2024. Em 2016 e 2020, o PT não elegeu nenhum candidato nas capitais do Nordeste.
Esses dados demonstram que, diferentemente de muitas análises, o avanço do PT em algumas capitais nordestinas deve ser visto de forma positiva para o partido. Pesquisas já sinalizaram alguns avanços na reta final da competição política no primeiro turno, como era o caso de Fortaleza, Teresina e Natal.
Desempenho do PT nas urnas em capitais nordestinas
De acordo com a terceira pesquisa Quaest para a Prefeitura de Fortaleza, divulgada no dia 25 de setembro, o candidato André Fernandes (PL) tinha 33% das intenções de votos válidos, e Evandro Leitão (PT), 31%. Os dois estavam tecnicamente empatados na liderança da corrida eleitoral. Essa configuração se confirmou nas urnas. André Fernandes registrou 40,20% dos votos (562.305) e Evandro Leitão ficou com 34,33% (480.174), e disputarão o segundo turno no próximo dia 27 de outubro. É a única capital na qual iremos acompanhar uma disputa partidária tal qual a eleição presidencial de 2022, entre PT e PL. A força do ministro Camilo Santana e do presidente Lula serão decisivas na disputa. Essa mesma eleição demonstra o quanto o ex-governador e ex-presidenciável, Ciro Gomes, não conseguiu retomar seu protagonismo político no seu estado.
Em Natal, a disputa estava bem mais embolada e apresentava incerteza sobre quem estaria em um eventual segundo turno. Na última pesquisa da Quaest, o cenário projetado deixava de fora a deputada federal Natália Bonavides (PT) que aparecia com 25% das intenções de votos válidos, o candidato governista, Paulinho Freire (União) registrava 37% e Carlos Eduardo (PSD), 35%. O resultado das urnas foi diferente das projeções, e a disputa de segundo turno será entre Natália, com 28,45% de votos válidos nas urnas, e Paulinho Freire, com 44,08%. Apesar do cenário não ser muito confortável para a candidata petista, é um avanço importante para o partido. Será primordial o papel da governadora Fátima Bezerra na campanha de segundo turno.
Havia uma expectativa muito grande do PT em relação à disputa na capital piauiense, Teresina, uma cidade que nunca foi governada pelo partido, o que contrasta com a situação do PT no governo do estado. Ao longo da campanha em Teresina, o desempenho do candidato petista, Fábio Novo, surpreendeu, seja diante do fracasso do atual prefeito, Dr. Pessoa (PRD), na tentativa de reeleição, ao apresentar uma avaliação muito negativa de sua gestão, e também de estar em uma disputa com a presença de um ex-prefeito, Sílvio Mendes (União Brasil). Na última pesquisa Quaest, Fábio Novo e Sílvio Mendes apareciam em empate técnico, com 48% e 47%, respectivamente. Um cenário que também poderia chegar a ser definido em primeiro turno para qualquer um dos candidatos. Nas urnas, Mendes foi mais bem sucedido pela preferência do eleitorado e eleito com 52,27% dos votos válidos. Novo teve 43,17%. Claro, o PT perde a oportunidade de fazer a diferença em Teresina, mas a força petista na reta final da disputa não pode ser descartada. Há espaço para investir em eleições futuras.
Em quatro capitais, o PT não teve candidatura própria, optando por apoiar algum candidato, como no Recife, ao apoiar abertamente João Campos, prefeito reeleito com votação recorde (78,11%). Ou a de se manter mais distante da disputa, como ocorreu nas disputas de Salvador, São Luís e Maceió, em que a presença petista foi muito tímida ou quase neutra.
Em Aracaju e João Pessoa, o PT lançou candidaturas próprias por decisões dos diretórios locais, mas os candidatos não foram exitosos nas urnas. A sergipana Candisse Carvalho, esposa do ministro e senador Rogério Carvalho, obteve 28.049 votos, 9,24% dos votos válidos. E o ex-prefeito da capital paraibana, Luciano Cartaxo, recebeu 49.110 votos, 11,77% dos votos válidos. Ambos terminam a competição política em quarto lugar.
E o que esperar no segundo turno?
Até aqui, o PT já saiu maior das urnas do que era esperado para a sigla. Entretanto, ir para o segundo turno em apenas duas capitais nordestinas não basta. É importante fazer uma campanha diferenciada e adotar todas as estratégias possíveis para vencer as disputas possíveis no segundo turno, em Natal e Fortaleza. Não há situação fácil para um partido que não se organizou adequadamente para mudar sua força política municipal.
A eleição atual, apesar de ainda não ter sido finalizada em algumas capitais, já demonstra o quanto o partido precisa melhorar sua organização interna e se fortalecer politicamente, não apenas nas eleições estaduais e presidencial, mas também nas capitais da região. Agora é esperar o que o segundo turno reserva ao partido.
* Luciana Santana é mestre e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professora da pós-graduação da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e da Universidade Federal do Piauí (UFPI ) e Secretaria Executiva da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP). Este artigo faz parte das análises produzidas pelo Observatório das Eleições 2024, iniciativa do Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação (INCT/IDDC).