A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta quinta-feira (11/9) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus por golpe de Estado após as eleições de 2022.
Entre os condenados, estão seis militares — da reserva, da ativa ou reformados (aposentados): o ex-presidente Jair Bolsonaro; o ex-candidato a vice general Walter Braga Netto; o ex-ministro da Defesa general Paulo Sergio Nogueira; o ex-ajudante de ordens tenente-coronel Mauro Cid; o almirante da Marinha Almir Garnier; e o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional general Augusto Heleno.
Com exceção de Alexandre Ramagem, todos os réus foram condenados pelos crimes de organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano contra o patrimônio da União; e deterioração de patrimônio tombado.
Por ser deputado federal, Ramagem (PL-RJ) não respondeu às acusações de dano contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado, ambas ligadas aos ataques de 8 de janeiro.
O STF também decidiu pela perda do mandato parlamentar de Ramagem e determinou como inelegíveis todos os condenados.
Mas não é todo o futuro dos militares condenados que foi definido no julgamento do STF.
Mesmo condenados à prisão, os seis continuarão com suas patentes e manterão seus salários de até R$ 38 mil, ao menos por enquanto.
Como determina a Constituição, os militares só podem ser excluídos das Forças Armadas por meio de um processo judicial específico na Justiça Militar.
É o Superior Tribunal Militar (STM) que irá avaliar se condenados são considerados “indignos” ou “incompatíveis” à função militar.
Num evento em São Paulo no último dia 29 de agosto, a presidente do STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, disse que caberá à Corte que comanda exercer papel de “tribunal de honra” em casos de perda do posto de oficiais das Forças Armadas eventualmente condenados pelo STF.
Caso o STM entenda que os militares não são “dignos” de fazer parte do quadro das Forças, eles perdem suas patentes — e consequentemente seus salários, se não houver mais possibilidade de recurso, esclarece Erika Kubik, professora na Universidade Federal Fluminense (UFF) e especialista em Justiça Militar.
“A perda de salário vem junto à perda de patente. É uma coisa única, colada, porque ele deixa de ser militar”, diz.
Mas esse salário pode se tornar uma pensão ao cônjuge ou filho menor do militar.
“É a tal morte ficta, caso peculiar previsto na legislação de pensões militares, que possui muitas críticas”, explica à BBC News Brasil a juíza federal da 12ª Circunscrição Judiciária Militar Patrícia Gadelha.
O entendimento da morte ficta considera a expulsão de um militar como se fosse o seu falecimento, garantindo assim pensão a seus dependentes.
Se houver decisão do STM para perda de patente, haveria então um processo administrativo dentro da respectiva Força Armada, explica o advogado Agnaldo Bastos, especialista em direito público e direito militar.
“O entendimento majoritário é que perda de patente implica perda do soldo e status militar, mas não extingue a pensão de dependente já constituído. Vai ser analisado caso a caso”, diz.
“Cada força vai abrir um processo interno para verificar direitos envolvidos sobre reserva, reforma, dependentes e direito à pensão”, completa Bastos.
De acordo com a Lei de Pensões Militares, com a morte ficta do militar os dependentes passam a receber pensão proporcional ao tempo de serviço.
Esse assunto, inclusive, tem sido alvo de discussão nos últimos meses em Brasília.
Em um projeto de lei proposto pelo governo Lula em 2024 para alterar aposentadoria dos militares, um dos itens pede justamente o fim dos casos em que a família de um militar expulso recebe pensão.
Pela proposta, a família passaria a receber auxílio-reclusão, no valor da metade da última remuneração do ex-militar, durante o período em que ele estiver cumprindo pena de reclusão por sentença condenatória transitada em julgado.
Parlamentares de direita e ligados às Forças Armadas já têm se articulado para retirar esse trecho do projeto de lei.
Em análise recente, o Tribunal de Contas da União (TCU) julgou que o direito à pensão militar “por morte” só ocorre após a morte real e não após a expulsão ou a demissão do militar.
Essa situação dos militares é diferente de outros funcionários públicos, que podem perder sua função (e salário) caso sejam condenados a prisão, já na decisão do juiz que o condena.
No caso de Bolsonaro, o ex-presidente recebe cerca de R$ 12,8 mil do Exército. Ele é um capitão reformado, uma espécie de aposentadoria no mundo militar.
Além dos vencimentos do Exército, Bolsonaro recebe ainda cerca de R$ 41 mil da aposentadoria de deputado pela Câmara. Como é presidente de honra do Partido Liberal (PL), o ex-presidente ganha outros R$ 41 mil, segundo divulgado pelo partido à imprensa.
Entre todos os réus militares julgados pelo STF, quem recebe o maior salário das Forças é o general Augusto Heleno, no valor de R$ 38,1 mil. Ele recebe proventos equivalentes ao posto de marechal — benefício comum a militares que passam à reserva com remuneração de um cargo acima do que ocupavam na ativa.
Além dos seis réus militares, há dois civis que saberão suas penas nesta semana: o ex-ministro da Justiça Anderson Torres e o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem.