Eu ando pensando muito sobre o tempo. Escrevo também, de vez em quando, mas nada suficiente para desaguar tudo o que venho elaborando internamente. Todas as manhãs, enquanto observo mais uma sutil mudança física no meu filho adolescente, fatalmente me esbarro nesse estado incompleto de tudo que o tempo acelerado demais vem me deixando. É nessa hora que eu perco as palavras e sinto-o mastigar os meus dedos, porque tentei segurá-lo nas mãos, apertando com força. Sigo reivindicando as horas que são levadas de mim a contragosto, e muitas vezes eu sinto vontade de sair do meu próprio corpo, pairando, me dissipando como maresia, só para observar de fora como tudo poderia funcionar sem a minha influência direta. Isso me faz pensar que este sentimento de descontrole ou até mesmo inexistência tem muito mais a ver com o irremediável que o tempo decreta.
Falando no tempo e na complexidade de tudo que o envolve, eu descobri que a luz do sol leva oito minutos e vinte segundos para chegar na Terra, mas não sei o que faço com essa informação agora no exato momento em que me encontro nesse ponto de suspensão, respirando fundo a cada notícia, seguindo pelo indefinido, acreditando no que é possível guardar no bolsinho da calça, tudo é descrença e fé, e Chico César nunca esteve errado. Pela ótica do mundo, eu deveria me acostumar com os ritmos acelerados que são impostos. Deveria, não é? Eu tento me convencer.
Em alguns dias, quando o tempo passa mais arrastado e eu não consigo sequer tirar o pijama e encarar o sol, ele ainda assim me escapa. Não é a velocidade cronológica da coisa toda, mas aquilo que vira areia e escorre por entre os dedos. E veja só o que acabei de notar: há tempos eu escrevo um punhado de versos que busquem algum significado para a palavra que me falta, procuro várias maneiras diferentes de não dizer nada, além de mencionar algo sobre como o tempo tem um passo apressado. Eu posso me partir em milhares de pedaços pontiagudos, mas exijo que meu coração permaneça inteiro. Saber que estar presente é ter a chance de prestar atenção ao mundo, e, ao prestar atenção, se espantar, eu nunca, por nenhuma razão, voltaria atrás no tempo. O que vi, eu já vi, então só o que me resta é morar dentro de mim e acatar as falhas, e angústias, e a finitude que esse tal de estar aqui estabelece. Ele é contraditório e não haveria de ser diferente, já que acaba sendo uma extensão clara da nossa existência tão contraditória quanto ele, então, se este texto não fizer nenhum sentido, é porque levar o tempo como ciência exata é insistir no que nos rouba o controle.
Saí na varanda para ver o fim de tarde, é que o céu anoitecendo tem uma imensa habilidade de melhorar a circulação de sangue pelo meu corpo. O tempo é um atropelador de momentos, uma variável importante para o transcorrer da vida, estejamos atentos então. “O tempo só anda de ida”, é, menino-passarinho-Manoel, eu aprendi isso mesmo, vidas atrás. Pensar nessa ideia costuma ser um substrato para minha criatividade, e mesmo vivendo no fio da navalha, e aceitando que sei pouco, insisto em me perguntar: o que sei, já não deveria ser suficiente? Me parece que o mundo sempre foi esse hospício com a gente trancado dentro, o que me faz cogitar que, se já estamos todos loucos, não seria uma tragédia se não pudéssemos pelo menos dançar descalços sobre as horas?
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