Maria Clara Gomes*
“Isso é revoltante. Vocês sabem o que é isso? Ser sepultado em cova rasa, 50 cm, coberto por areia. Depois de 15, 20 dias de vento e chuva, o caixão volta a aparecer. É um absurdo”. Essa declaração é da professora Neirevane Nunes, que após perder o primo recebeu da Prefeitura de Maceió uma cova rasa no Cemitério São José, localizado no bairro do Trapiche da Barra.
A desumanização à qual as famílias que não têm condições de pagar por um túmulo particular estão submetidas vai além das covas rasas. Neirevane denuncia ainda que várias pessoas estão sendo enterradas na passagem do cemitério, isto é, no caminho que originalmente foi feito para servir de trajeto para quem vai visitar a sepultura de um parente.
As denúncias, muitas vezes feitas pelos próprios cidadãos lesados através de suas redes sociais, continuam a surgir, escancarando a superlotação das áreas e o total descaso da gestão de JHC, responsável pelos cemitérios municipais. As famílias abaladas pela perda de um ente, ainda precisam enfrentar a constante violação de direitos e o constrangimento de não poder proporcionar um sepultamento digno.
Em ruínas, os cemitérios de Maceió estão abandonados e com estrutura deteriorada, consequência da má gestão. O descaso levou ao fechamento da capelinha do Cemitério São José, cujo teto colapsou há mais de um ano, sem que nenhuma medida efetiva tenha sido tomada.
A deterioração dos serviços funerários e o descumprimento de questões básicas não apenas violam a legislação brasileira que garante o direito de sepultar, ser sepultado e permanecer sepultado, como também representam um risco à saúde pública e sanitária do município de Maceió.
Vítimas da Braskem
A mineração predatória de sal-gema realizada pela petroquímica Braskem e que retirou mais de 60 mil pessoas de suas casas desde 2018, também afetou o Cemitério Público de Santo Antônio, no bairro de Bebedouro.
Desde a interdição para sepultamentos, moradores e ex-moradores de Bebedouro têm denunciado o descaso da prefeitura, que, após protestos, reabriu o local para visitação. Entretanto, a demanda pela construção de um novo cemitério não foi atendida, levando a população a exigir que João Henrique Caldas forneça jazigos ou gavetas em cemitérios particulares, com melhor estrutura.
Através de um trabalho conjunto entre o Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU) e do Ministério Público do Estado de Alagoas (MP/AL), foi disponibilizado, em junho de 2024, um canal de comunicação para que a população afetada pela interrupção dos serviços do Cemitério Santo Antônio possa relatar os danos sofridos e contribuir para a formatação de um Programa de Compensação com a Braskem.
Apenas em agosto deste ano, a prefeitura começou a convocar os proprietários de jazigos no Cemitério Santo Antônio para uma atualização cadastral obrigatória, com o objetivo de “garantir a organização e a manutenção adequada dos registros, bem como melhorar os serviços prestados aos usuários do campo santo”.