O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quarta-feira (20) que a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresente explicações, no prazo de 48 horas, sobre trechos do relatório da Polícia Federal (PF) que apontam o risco de fuga do país e descumprimentos reiterados de medidas cautelares impostas pela Corte.
A decisão de Moraes ocorre no mesmo dia em que Bolsonaro e o filho dele, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), foram indiciados pela PF sob suspeita de coação no curso do processo e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, no âmbito das investigações da trama golpista que tentou reverter o resultado das eleições de 2022.
Pedido de asilo a Milei
Entre os elementos destacados pela PF está a descoberta de uma carta encontrada no celular de Jair Bolsonaro dirigida ao presidente da Argentina, Javier Milei, na qual o ex-presidente solicita asilo político. Segundo os investigadores, o documento foi produzido pela esposa do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e salvo no aparelho do pai em 10 de fevereiro de 2024, apenas dois dias após a deflagração da Operação Tempus Veritatis, que apura a participação de militares e civis em uma conspiração golpista.
Moraes afirmou que a existência do pedido de asilo reforça o risco de fuga e evidencia a intenção de Bolsonaro de se esquivar das investigações. “Intime-se a defesa de Jair Messias Bolsonaro para que, no prazo de 48 horas, preste esclarecimentos sobre os reiterados descumprimentos das medidas cautelares impostas, a reiteração das condutas ilícitas e a existência de comprovado risco de fuga”, escreveu o ministro.
Violações de cautelares
No despacho, Moraes também citou descumprimentos sistemáticos das restrições determinadas pelo STF, como a proibição de uso de redes sociais e contatos com aliados políticos. De acordo com a PF, Bolsonaro manteve trocas de mensagens com o pastor Silas Malafaia, o advogado americano Martin de Luca e o ex-ministro da Defesa e candidato a vice em 2022, Walter Braga Netto. Além disso, continuou a alimentar grupos digitais com mensagens políticas, em “clara afronta” às ordens judiciais.
Bolsonaro está em prisão domiciliar desde 4 de agosto, medida decretada pelo Supremo após sucessivas violações de cautelares. Diferente de decisões anteriores, Moraes não afirmou neste despacho que o descumprimento poderia levar ao endurecimento das restrições, mas o risco segue em análise.
Indiciamento pela PF
Em paralelo, a Polícia Federal concluiu o relatório da investigação sobre a atuação de Eduardo Bolsonaro no exterior. Segundo os agentes, o deputado deixou suas atividades parlamentares em fevereiro e mudou-se para os Estados Unidos, onde passou a articular, junto ao governo de Donald Trump, medidas de retaliação contra o Brasil. Entre as iniciativas defendidas, estavam a imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros e a aplicação da Lei Magnitsky contra ministros do STF, em especial Alexandre de Moraes.
O relatório aponta que Jair Bolsonaro enviou ao filho R$ 2 milhões, oriundos de uma campanha de arrecadação via Pix que recebeu mais de R$ 18 milhões em doações de apoiadores, para custear sua estadia no exterior. A PF concluiu que pai e filho atuaram de forma coordenada para pressionar o Supremo e tentar interferir nas investigações da tentativa de golpe de Estado.
Reações e próximos passos
A Procuradoria-Geral da República (PGR), comandada por Paulo Gonet, recebeu as conclusões da PF e deve decidir nas próximas semanas se apresentará denúncia contra Jair e Eduardo Bolsonaro.
Enquanto isso, a situação política de Eduardo se agrava: o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), encaminhou à Comissão de Ética pedido de cassação do mandato do deputado, com base em representações apresentadas por PT e Psol.
Jair Bolsonaro é réu em outra ação penal no STF que trata do núcleo central da trama golpista de 2022. O julgamento está marcado para 2 de setembro e colocará o ex-presidente e sete de seus principais aliados no banco dos réus por crimes como organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Até a conclusão desta reportagem, a defesa de Jair Bolsonaro não havia se manifestado sobre a intimação de Moraes nem sobre o indiciamento. Eduardo, por sua vez, classificou a investigação como um “crime absolutamente delirante” e criticou o que chamou de vazamento de conversas privadas entre pai e filho.