A política alagoana ganhou novos contornos de tensão após o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), promover uma verdadeira “limpeza” em sua administração. Em edição extraordinária do Diário Oficial do Município, JHC exonerou 52 servidores ligados à Secretaria Municipal de Gestão de Pessoas e Patrimônio (SEMGE). Todos ocupavam cargos comissionados de livre nomeação, com funções de assessoria técnica e de apoio.
As demissões em massa, porém, têm endereço certo: os exonerados eram indicações políticas de dois nomes até então aliados do prefeito — o deputado estadual Mesaque Padilha (UB) e Gunnar Nunes Nicácio, coordenador de Mídia e Relações Públicas Institucionais da Assembleia de Deus em Alagoas (AD Alagoas), além de filho do pastor-presidente da denominação, reverendo José Orisvaldo Nunes de Lima.
O estopim da crise foi a decisão do grupo ligado à AD Alagoas de deixar o PL, partido de JHC, e se filiar ao PP (Progressistas), sigla comandada no estado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. A movimentação foi interpretada como uma traição política e causou uma resposta imediata do prefeito da capital.
A Assembleia de Deus em Alagoas tem se consolidado como uma das forças mais influentes da política estadual. O deputado Mesaque Padilha, eleito em 2022 com forte apoio do segmento evangélico, tem sua base fincada entre lideranças e fiéis da denominação. Até recentemente, contava com o respaldo direto do pastor José Orisvaldo Nunes, que via em sua candidatura uma forma de garantir representação cristã na Assembleia Legislativa (ALE).
No entanto, para 2026, o cenário mudou. Fontes ligadas à cúpula da igreja afirmam que o pastor-presidente deve manter Padilha na disputa pela reeleição, mas tem se empenhado em lançar o próprio filho, Gunnar Nunes, como candidato a deputado federal. Gunnar, que atua na comunicação da AD Alagoas e é chefe de gabinete de Padilha, tem sido apresentado como o novo rosto político da igreja — jovem, articulado e com forte apelo junto ao público religioso.
A entrada de Gunnar no PP foi oficializada em um ato realizado no Ritz Hotel Lagoa da Anta, em Maceió, repleto de lideranças políticas e religiosas. O evento contou com a presença de Arthur Lira, do deputado Marx Beltrão, do Delegado Fábio Costa e do próprio Mesaque Padilha. Na plateia, em posição de destaque, estava o reverendo José Orisvaldo, cuja presença foi interpretada como um aval institucional ao movimento.
Durante o discurso, Gunnar afirmou que sua futura candidatura será pautada na “defesa dos valores cristãos” e da “liberdade religiosa”, bandeiras que ecoam no discurso político das principais lideranças evangélicas do país.
A reação de JHC e o rompimento político
JHC, que havia concedido recentemente um terreno à Assembleia de Deus no conjunto Eustáquio Gomes — em um ato visto como gesto de aproximação com o segmento evangélico —, teria se sentido traído pelo pastor-presidente e seu filho.
Segundo aliados, o prefeito considerava a parceria com a AD Alagoas estratégica para fortalecer sua base eleitoral em Maceió e no interior, sobretudo com vistas à eleição de 2026. A saída de Gunnar e Padilha do PL, nesse contexto, não apenas fragilizou sua rede de apoio como expôs fissuras na relação entre política e religião no estado.
A resposta veio em forma de retaliação: a exoneração dos 52 cargos ligados ao grupo. Embora oficialmente tratadas como “decisões administrativas”, as demissões foram vistas como um recado claro — JHC não pretende tolerar dissidências internas nem permitir que estruturas do seu governo sirvam a interesses de outros partidos.
O episódio evidencia o delicado equilíbrio entre fé e política em Alagoas. A Assembleia de Deus, com sua ampla rede de templos, projetos sociais e presença capilarizada nos bairros e municípios, representa um ativo eleitoral de peso. Em eleições recentes, o apoio institucional da igreja foi determinante para o sucesso de candidaturas tanto no Legislativo quanto no Executivo.
A migração do grupo para o PP reforça o poder de articulação de Arthur Lira, que segue ampliando sua influência sobre lideranças regionais em preparação para 2026. Para JHC, o desafio será reconstruir pontes com o eleitorado evangélico sem a mediação da Assembleia de Deus — e manter sua base coesa diante das pressões crescentes da disputa por espaço e poder.
Em um cenário em que púlpito e palanque caminham cada vez mais próximos, a crise entre o prefeito e a igreja sinaliza que a corrida eleitoral em Alagoas já começou — e promete ser marcada por fé, influência e traições políticas.
/Revista Fórum















