O servidor do Poder Judiciário e ex-presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário de Alagoas (Serjal/AL), Ednor Emídio da Costa Lima Gonzaga Junior, foi denunciado pelo Ministério Público Estadual (MPE) por peculato. A promotora Alba Lúcia Torres ofereceu denúncia contra Ednor com base no Inquérito Policial número 095/2015 – 22º DPC.
O ex-dirigente sindical é acusado de dilapidar o patrimônio do Serjal/AL através de desvios de recursos da entidade classista. Um Boletim de Ocorrência (BO) traz requintes de detalhes de como o esquema era operacionalizado e também uma possível participação de outros diretores que estariam recebendo valores “indevidos”.
Com base nesse depoimento, a defesa de Ednor, feita através do advogado Diego Marcus C. Mousinho, destaca: “Percebe-se que há claramente um equívoco aqui, quanto a acusação ser apenas contra o Sr. Ednor. […] A candidata a presidente à época, constava nas folhas de pagamento como prestadora de serviço de consultoria da também atual a época Diretora de Imprensa/Comunicação”.
Início da investigação
À peça do MPE diz que no dia 11/11/2014 chegou uma denúncia anônima na sede do sindicato (Serjal), relatando que diretores estariam recebendo valores indevidos no exercício de suas funções na entidade classista. A denúncia junto com um processo administrativo foram encaminhados pela Promotoria de Justiça Coletiva Criminal de Atribuição Não Privativa à delegacia competente para que fosse instaurado Inquérito Policial.
À delação anônima, de acordo com a denúncia do órgão ministerial, apontava a existência de diversos pagamentos a diretores, dentre eles, “prestação de serviços advocatícios ao sindicato por parte de pessoas impedidas (recibo de pagamento a Gláucio Guimarães Medeiros, diretor jurídico sindical)”. Além disso, o esquema contava com uma manobra de gratificações pagando altos valores a servidores da entidade incompatíveis com os cargos que exerciam e os acordos coletivos firmados, chegando a um rombo de quase R$ 500 mil apenas nesse quesito.
Os fatos
Emerge da peça inaugural investigatória que Ednor Gonzaga presidiu o Serjal por dois mandatos compreendendo o período entre 2009 a 2014. Ao final de seu segundo mandato foi formado uma chapa tendo como candidata à presidente a servidora Raquel Faião e Ednor Gonzaga como diretor financeiro. De acordo com a denúncia do MPE, já durante o período eleitoral foi apresentado à chapa um empréstimo feito por Ednor junto à Juriscred no montante de R$ 230 mil. Na oportunidade foi dada a sede do sindicato como garantia de pagamento do referido empréstimo. Questionado pela base, Ednor justificou que o empréstimo foi realizado para cobrir despesas com a eleição sindical e que o débito seria pago com o imposto sindical da entidade. Ao final do pleito, a chapa de Raquel Faião foi eleita.
Em janeiro de 2015, Raquel Faião Rodrigues assumiu à presidência do Serjal e o acusado Ednor Emídio da Costa Lima Gonzaga Júnior o cargo de diretor financeiro. Débitos começaram a surgir, dentre eles, mais de R$ 250 mil referente ao plano de saúde Unimed dos filiados que não estava sendo pago. Conflitos começaram a surgir entre Raquel Faião e Ednor Gonzaga. Consta na denúncia do MPE que durante um certo tempo, no início da gestão de Faião, os cheques da entidade foram assinados ainda por Ednor e a antiga diretora financeira, Ana Paula Araújo Rodrigues Lins, sob a constante justificativa da existência de problemas com o office boy da entidade, Zenildo Terto, motivo pelo qual ele não conseguia ir ao cartório reconhecer as firmas dos novos diretores.
Em março de 2015 Raquel Faião se afastou das atividades sindicais por motivo de licença-maternidade. Assume a presidência o então vice, Reinaldo Vital Rios, ficando à frente da entidade pelo período de 20 de março a 20 de outubro de 2015, quando Faião retorna às atividades classistas.
Farra com dinheiro dos sindicalizados
De acordo com a denúncia do MPE, notas fiscais encontradas demonstram que uma verdadeira farra vinha sendo feita com o dinheiro dos sindicalizados. Produtos adquiridos não foram encontrados no sindicato, como cafeteira de última geração, computadores, ar-condicionado, móveis planejados e aparelhos celulares, além da compra injustificada de carnes, cervejas, roupas para uso pessoal, perfumes, festa para filha do acusado, dentre outros itens. Ao vir à tona tal situação, um colegiado do sindicato reuniu-se e decidiu pela destituição de Ednor Gonzaga do cargo de diretor financeiro.
Esquema de gratificações e superfaturamentos
Simony da Conceição Rocha, que na gestão Ednor, ocupava o cargo de auxiliar financeira, ao ser inquirida sobre valores a mais colocados em seu contracheque a título de gratificação, assim declarou: “o presidente Ednor falava que precisava colocar um valor a maior no contracheque para justificar gastos que já haviam sido efetuados e não existiam notas fiscais para comprovar os gastos (…)”, e aduziu que “apenas recebia 15% de gratificação calculada sobre seu salário base por constar em acordo coletivo”.
Em relação aos altos valores de gratificações e pagamentos a funcionários do Serjal e profissionais autônomos, estes afirmaram que não recebiam o montante indicado no contracheque, e que só lhe eram efetivamente pagas as gratificações firmadas no Acordo Coletivo de Trabalho, cujo valores reais eram muito abaixo do que era registrado em seus contracheques e do montante retirado do caixa da entidade.
Algo que chamou atenção foi o fato de que, apesar do débito com a Unimed encontrar-se aberto, colocando em risco o plano de saúde dos filiados, havia a antecipação de pagamentos para advogado, taxista e posto de combustíveis, em valores exacerbados acima da média praticada no mercado.
Saques na ‘boca do caixa’
Em sede de declarações, o auxiliar administrativo (office boy) do sindicato, Zenildo Terto da Silva, afirmou que “realizava saques na boca do caixa com cheques do Serjal, assinados pelo diretor presidente e diretora financeira como de costume para pagamento de GPS, por exemplo. Eram também realizados saques e os valores encaminhados para o senhor Ednor e, às vezes, entregue para esposa do Ednor. Tais valores variavam entre R$ 10 mil e R$ 15 mil mensal…”.
Auditoria Contábil
Foi realizada auditoria contábil pela empresa Convicta Auditores Independentes com a finalidade de examinar a movimentação financeira e o patrimônio do Serjal no período compreendido entre 1 de janeiro de 2009 a 31 de dezembro de 2015. O relatório apontou “saques de valores totais expressivos das contas-correntes do Serjal”, revelando, segundo a auditoria, “fragilidade nos controles internos da entidade sindical, permitindo-se, assim, ocorrência de erros e fraudes”.
Ainda de acordo com o levantamento contábil “as gritantes diferenças observadas nos saldos das contas bancárias pertencentes ao Serjal são oriundas de pagamentos realizados pelos gestores financeiros da entidade à época, uma vez que não restam documentos ou comprovações hábeis de que os desembolsos foram feitos de maneira correta”. O resultado desta auditoria não foi divulgado para os filiados do sindicato.
O que diz a atual gestão
A reportagem da Folha de Alagoas entrou em contato com a atual direção do Serjal/AL. O presidente da entidade, Aluciano Martins, preferiu não se manifestar. Thiago Machado, assessor especial da presidência, garantiu que o Serjal está colaborando através de informações com o Ministério Público Estadual para “que um pene fino seja realizado na instituição”. O assessor ainda expôs que uma audiência de instrução está marcada para novembro e que alguns desses diretores, que são acusados de receberem valores indevidos, irão participar.
O crime
Peculato se caracteriza por crime praticado por funcionário público contra a própria administração pública. Tais crimes encontram-se tipificados nos artigos 312 e 313 do Código Penal.
No caso de Ednor, a denúncia oferecida pelo MPE tem como sustentação o artigo 312, que enfatiza: “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de quem tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio. Pena – reclusão, de 2 a 12 anos, e multa”.
O MPE aponta evidências de elevação patrimonial do acusado no período em que esteve à frente da entidade sindical, como também a existência de claros indícios que Ednor Emídio da Costa Lima Gonzaga apropriou-se de bens e valores pertencentes ao Serjal de forma sistemática e continuada.
Posicionamento da defesa
A reportagem da Folha de Alagoas, como manda a prática do bom jornalismo, entrou em contato com o advogado de Ednor Gonzaga para ouvir a versão do acusado. Diego Marcus C. Mousinho disse que em relação ao processo criminal ainda não foi preparada a defesa. Quanto ao processo cível, o advogado informou que a tese da defesa baseia-se na inexistência de comprovação de apropriação indébita, uma vez que, segundo ele, seu cliente recebia os pagamentos e repassava para empresas que eram feitas as compras, tudo justificado mediante comprovantes. Ainda de acordo com o advogado, o MPE não tem comprovação de má fé da utilização do dinheiro em benefício de seu cliente